A indústria nacional está em pé de guerra com o setor portuário, por causa de uma cobrança extra que os terminais passaram a aplicar sobre os importadores e exportadores do País relacionada ao escaneamento dos contêineres que transitam pelos portos brasileiros.
A regra imposta desde 2014 pela Receita Federal exigiu que os terminais portuários se equipassem para fazer a leitura automática de cada um dos contêineres que entram e saem do País, seja com carga ou vazio. Os portos atenderam à determinação, mas passaram a cobrar os importadores e exportadores pelo novo serviço. O monitoramento eletrônico, que era esporádico, passou a ser aplicado em praticamente todos os contêineres movimentados pelos principais portos brasileiros. A indústria se rebelou.
Por meio da Confederação Nacional da Indústria (CNI), 44 associações setoriais de indústria e do agronegócio e federações estaduais entraram com um processo na Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), para pedir a suspensão imediata da cobrança, que alegam ser abusiva e ilegal. A fiscalização aduaneira, dizem os importadores e exportadores, é uma responsabilidade inerente à rotina dos terminais portuários. Paralelamente, os usuários dizem que já pagam por uma “cesta de serviços” para movimentar seus contêineres e cargas.
“Essa cobrança é absolutamente ilegal. Muitos portos estão escaneando 100% dos contêineres, quando a lei determina que se faça um gerenciamento do risco. Os portos transformaram a exigência em uma nova fonte de arrecadação para eles”, diz Carlos Abijaodi, diretor de desenvolvimento industrial da CNI. “Essa situação é inacreditável, tem de parar imediatamente. Se for preciso, vamos levar esse tema para a Camex (Secretaria-Executiva da Câmara de Comércio Exterior).”
Os portos revidaram. Para a Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), que reúne 80 associados responsáveis pela movimentação de 70% da carga geral que transita no País, “não se pode criar obrigações novas a um agente privado e ao mesmo tempo impedi-lo de repassar os custos decorrentes aos seus preços”, porque isso equivaleria a obrigá-los à “prestação gratuita do serviço, proporcionando o enriquecimento ilícito daqueles que dele se beneficiam”.
Não há dúvidas sobre a necessidade da cobrança, diz José Di Bella Filho, diretor-presidente da ABTP. “Quando sou arrendatário de um porto, faço um contrato onde minhas remunerações e obrigações estão ali definidas. Se eu não puder cobrar do tomador de serviço algo que não estava previsto e que passei a ser obrigado a oferecer a esse usuário, não há como trabalhar. A exigência do escaneamento recai sobre a carga, por isso ela é atribuída ao dono da carga.”
Cobrança. Além de sustentar que a cobrança é uma prática ilegal, a CNI declarou que há uma enorme disparidade nos preços praticados pelos portos brasileiros, com valores oscilando entre R$ 39,28 e R$ 1.032 para passar pelo aparelho de scanner cada um dos contêineres que entram ou saem do País, com carga ou vazio.
Indústria e portos não têm um número fechado sobre quanto essa cobrança tem movimentado em todo o País. O que se sabe é que se trata de um negócio de, pelo menos, algumas centenas de milhões de reais por ano. Cerca de 5,3 milhões de contêineres trafegam anualmente pelos portos brasileiros. Entre janeiro e julho deste ano, 3.173 milhões de unidades já passaram pelos cais nacionais.
Procurada pela reportagem, a Antaq declarou que “está analisando o assunto e deve deliberar sobre o mesmo em breve”.
Uma análise do caso concluída por técnicos da agência, porém, já deixou claro qual é o posicionamento: a indústria não tem de pagar pelo serviço.
O Estado teve acesso a uma nota técnica da Antaq, segundo a qual o escaneamento “é pré-requisito essencial para o alfandegamento dos terminais portuários”. “Deste modo, conclui-se pela impossibilidade de cobrança autônoma a título de inspeção não invasiva de contêiner, na medida em que não se pode determinar a existência de serviço quando as movimentações atreladas decorrem de obrigação legal e de risco à atividade pública delegada aos terminais portuários, seja por concessão, arrendamento ou autorização”, afirma o documento.
Fonte: Estadão
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